O ensino de Arte na escola: interfaces com as artistas locais
La educación artística en la escuela: la interfaz con los artistas locales
BARROS, N.B
Acadêmica do curso de Especialização em Artes Visuais/EBA/UFMG
ANJOS, C.R
Professora orientadora do Curso de Especialização em Artes Visuais/EBA/UFMG
Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais – EBA/UFMG - Brasil
RESUMO
O texto “O ensino de Arte na escola: interfaces com as artistas locais” é parte da monografia
que será apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ensino de Artes Visuais/EAD
realizado pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, em agosto
de 2009. A investigação teve como objetivo identificar, descrever e compreender como se dá
a aproximação da produção artística local com o ensino da Arte, especificamente, com os
alunos do nono ano de uma escola da rede estadual de educação da cidade de Araçuaí, a
partir das definições, pressupostos e indicações pedagógicas presentes na LDBEN 9394/96
e da Proposta Curricular do Estado de Minas Gerais. Buscou, assim, aprofundar o
entendimento da escola quanto à inserção do trabalho das artistas locais nas práticas
cotidianas da mesma. A metodologia usada foi o estudo de caso, no qual foram feitas
observações das práticas cotidianas de ensino da Arte, bem como entrevistas semiestruturadas
com duas artistas, com estudantes e com o professor de Arte. Os resultados da
pesquisa evidenciam que a escola tem avançado muito lentamente nessa concepção,
principalmente no que se refere apropriação da produção artística local como conteúdo de
estudo da disciplina.
RESUMEN
El texto "La educación artística en la escuela: la interfaz con los artistas locales, es parte de
la monografía se presentará a la Post-graduado de la Escuela de Artes Visuales / EAD
llevada a cabo por la Escuela de Bellas Artes de la Universidad Federal de Minas Gerais en
agosto de 2009. La investigación tuvo como objetivo identificar, describir y comprender cómo
el enfoque de la producción artística local com la educación de arte, específicamente con los
estudiantes de noveno grado en una escuela en el sistema estatal de educación en la ciudad
de Araçuaí de las definiciones , los supuestos y las indicaciones pedagógicas presentes en
LDBEN 9394/96 y la estructura propuesta para el Estado de Minas Gerais. Buscamos tanto,
profundizar en la comprensión de la escuela y la inserción de la obra de los artistas locales
en las prácticas cotidianas de la misma. La metodología utilizada fue un estudio de caso en
el que se realizaron observaciones de las prácticas cotidianas de la enseñanza del arte, así
como entrevistas semi-estructuradas con los dos artistas, con los estudiantes y el profesor
de Arte. Los resultados del estudio muestran que la escuela se ha movido muy lentamente
en este punto de vista, especialmente con respecto a la propiedad de la producción artística
y el estudio de contenido local de la disciplina.
Palavras-chave: arte, educação, ensino e cultura.
Palabras-claves: arte, educación, educación y cultura.
Este artigo consiste de reflexões que foram se constituindo ao longo da nossa
prática pedagógica e, conseqüentemente, durante o curso de Pós-graduação em
Ensino de Artes Visuais, modalidade a Distância, realizado pela Escola de Belas
Artes da Universidade Federal de Minas Gerais – EBA/UFMG, especialmente da
primeira autora com o ensino de arte e que nos estimularam a buscar uma
compreensão mais situada deste campo de conhecimento numa escola da rede
estadual da cidade de Araçuaí- MG.
Algumas indagações serviram de ponto de partida: as práticas pedagógicas,
especificamente, o ensino de Arte está dialogando com a produção artística local?
Por que a escola não utiliza como material didático a produção artística local? Por
que os estudantes não conhecem a produção artística da região onde vivem? Como
está o ensino de Arte na Escola Estadual Dom José de Haas a partir da LDBEN
9394/96? Em que a Proposta Curricular do Estado de Minas Gerais está contribuindo
para o ensino da arte?
Para problematizar e responder a essas questões foram revistas as várias e
permanentes discussões acerca do ensino da arte no Brasil e, principalmente, na
Rede estadual de ensino de Minas Gerais a LDBEN 9394/96 é, sem dúvida, um
marco significativo na História da Arte/Educação e, mais especificamente, no ensino
da arte, porque estabelece tal disciplina como componente obrigatório da educação
básica. Da mesma forma a Proposta Curricular do Estado de Minas Gerais/Arte/
2006 porque considera a arte como uma área de conhecimento com especificidades
e elementos próprios em sua constituição.
A necessária delimitação de um problema de investigação nos levou a um
recorte desse ensino da arte numa escola da rede estadual de ensino/MG/Araçuaí.
Teve como objetivo compreender como se dá a aproximação da cultura local,
especificamente o artesanato, com o ensino de Arte na Escola Estadual Dom José
de Haas, bem como com os estudantes da referida escola. Especificamente, o tipo
de apropriação que os professores de Arte têm da arte local, em especial o
artesanato, como área do conhecimento na formação estética e crítica dos alunos;
como os estudantes desenvolvem suas habilidades artísticas e como as relacionam
com as produções dos artistas locais, bem como as produções de seus colegas e
seus respectivos interesses em conhecer a história de vida dos artesãos da região e
a valorização do artesanato do Vale do Jequitinhonha.
A pesquisa foi de natureza qualitativa, configurando-se em um Estudo de
Caso desenvolvido em uma escola de rede estadual de ensino, na cidade de
Araçuaí. A escola escolhida foi a Escola Estadual Dom José de Haas por conter um
alunado bastante diversificado, oriundo de áreas periféricas e da zona rural que
convive com as mais variadas situações da vida cotidiana. As técnicas utilizadas
foram: levantamento bibliográfico permanente, tomando como referência central
Pimentel (1999) que favoreceu maior entendimento da relação professor/aluno no
processo de ensinar e aprender arte, quando diz:
ensinar e aprender arte não é um processo de mão única. Depende da
participação efetiva de professores e alunos. Ambos têm conhecimento e
experiência no assunto e experiência de vida, isto é, aprendizagem
institucional (1999, p. 41).
Além disso, entrevistas semi-estruturadas, observação sistemática do
cotidiano da escola; observação participante; coleta de depoimentos orais e pesquisa
documental junto ao acervo da Escola e de outras fontes.
Por conta da limitação de espaço, neste artigo privilegiamos os depoimentos
das artistas locais, dos estudantes e do professor de Arte da escola pesquisada, em
que pese o texto completo da pesquisa abranger outras atividades relativas a esta
disciplina.
Desenvolvimento
Este estudo visou refletir sobre o significado sócio-cultural da Arte no contexto
escolar, no sentido de ampliar a percepção, a imaginação e a capacidade de
expressão dos estudantes da Escola Estadual Dom José de Haas e, também sobre a
contribuição para o crescimento pessoal, experiência lúdica e humanizadora e,
sobretudo, para a construção do conhecimento, interpretação, expressão artística e
transformação da realidade.
Para isso, necessário se fez buscar elementos na expressividade da
população da região, sobretudo, dos artistas e da produção artística. Para mais
adiante, dialogarmos com o ensino de Arte na escola.
No Vale do Jequitinhonha, a cultura é manifestada de várias formas, por meio
da música, teatro, festas religiosas, dentre outras. Porém, a manifestação cultural
mais forte, que traduz com fidelidade a resistência e a luta de um povo é o barro e a
madeira é possível sustentar a vida que está expressa no artesanato. É o berço de
vários artesãos como Lira Marques, Zefa, Adão, D. Isabel, dentre outros,
reconhecidos mundialmente.
Em depoimento, D. Lira e D. Zefa verbalizaram, entre outras, sobre suas
produções, bem como de suas impressões sobre o ensino de Arte nas escolas de
Araçuaí e o reconhecimento de seus trabalhos na região onde vivem e produzem.
A partir do depoimento D. Zefa, pudemos constatar que existe um preconceito
muito grande em relação ao que o pobre e o negro, bem como em sua produção.
Isso fica evidente na fala da artista, quando revela que
o que eu faço, as peças que crio, fossem produzidas por pessoas de posse,
com certeza estariam numa condição bem melhor do que a minha e sua
arte reconhecida e valorizada (Entrevista realizada em 26/04/2009).
Já no depoimento de D. Lira, ficou evidenciado que a sua arte é muito
reconhecida pelas pessoas de fora, mas desvalorizada pelo povo de sua região,
principalmente do seu município. Afirmou também que essa desvalorização está
relacionada à falta de reconhecimento do seu trabalho, como arte.
No entanto, pudemos verificar que essas artistas são conhecidas e
reconhecidas nacionalmente e, até mesmo, internacionalmente pela grandiosidade
da sua arte. Embora não tenham atingido o reconhecimento por parte da
comunidade local, elas atribuem aos educadores em geral a responsabilidade de
fazer da escola um espaço de preservação da cultura, proporcionando aos
estudantes o contato com as mais variadas manifestações culturais.
Sobre isso, percebemos que não existe, ainda, por parte das escolas, dos
professores de Arte e, menos ainda, por parte de professores de outras áreas do
currículo escolar, o conhecimento e reconhecimento enquanto expressão de um
povo. Apesar das indicações da legislação em vigor, LDBEN 9394/96, e as
proposições curriculares oficiais, PCN/Arte (1998), PCMG/Arte (2004) e o CBC/Arte
(2005) para esse ensino, de forma a conhecer, considerar e interpretar as
expressões artísticas regionais, nacionais e internacionais e a partir da reflexão,
contextualização e do fazer artístico ampliar o repertório visual do estudante. Estas
indicações, de acordo com nossa interpretação, estão presentes nos elementos de
composição das obras de artes visuais – escultura, modelagem e pintura que fazem
parte do Eixo Temático I “Conhecimento e expressão em Artes Visuais” do CBC
(Conteúdo Básico Comum) em Arte do Ensino Fundamental do 6º ao 9º anos.
Na entrevista realizada com os estudantes da referida escola, percebemos um
desconhecimento, de um modo geral, da vida e obra dos artistas de Araçuaí embora
esses jovens reconheçam o valor da arte, pois sabem que com ela, eles se
aproximam de saberes culturais, reconhecem suas raízes, além de desenvolver
conhecimentos estéticos e artísticos, competências e habilidades como define as
Proposições Curriculares do Estado de Minas Gerais/Arte:
arte é a oportunidade de uma pessoa explorar, construir e aumentar seu
conhecimento, desenvolver suas habilidades, articular e realizar trabalhos
estéticos e explorar seus sentimentos. O ensino de arte deve possibilitar a
todos os alunos a construção de conhecimentos que interajam com sua
emoção, através do pensar, apreciar e do fazer arte (2008, p.12).
No entanto, percebemos que esses alunos manifestaram interesses em
conhecer as obras de Lira e Zefa, ou mesmo de outros artesãos locais, e mais, que
essas obras sejam tomadas como objeto de estudo.
Já com o professor de Arte da turma investigada, pudemos perceber que sua
prática é fundamentada no que define o CBC de Arte para os anos finais do ensino
fundamental; porém, a parte prática, no que diz respeito à utilização do artesanato
local como objeto de estudo, fica restrito a material teórico e de áudio, o que foi
justificado pelo mesmo, a falta, na maioria das vezes, de adequação dos materiais
pela escola.
Considerações finais
Embora muitos traços do passado tenham se extinguido com a globalização,
presenciamos os artesãos que relutam contra as intempéries do tempo e que
continuam preservando sua arte, manifestada especificamente no artesanato, que
não perdeu sua majestade, pois continua muito rico e diversificado como grande
destaque da riqueza cultural do Vale do Jequitinhonha.
Apesar da falta de acesso a produção artística da região, os estudantes
demonstram a vontade e necessidade de conhecê-la, e avaliam que a escola seria
um veículo em potencial para isso.
Em relação à escola, percebemos que falta uma apropriação maior da arte da
região, principalmente pelas indicações pedagógicas contemporâneas que requer um
ensino mais voltado para realidade de seus atores.
Diante dos fatos observados, percebemos, também, a importância e
necessidade da escola em replanejar sua proposta curricular na busca da
valorização da arte como forma de crescimento pessoal e social dos alunos. Além de
aprender a produzir e apreciar trabalhos de arte é importante que os alunos
aprendam a valorizar a produção artística de diversos grupos sociais e que essa
aprendizagem seja iniciada com os artistas locais, com respeito às suas origens,
preservando essas manifestações artísticas para que possam perpetuar no tempo e
não acabem fazendo parte somente de acervo literário, virando história.
Em que pese os avanços e movimentos realizados pela escola para significar
os conteúdos escolares, ainda há uma distância grande para considerar o potencial e
a qualidade do trabalho das artesãs locais e a utilização da matéria prima disponível
na região como conteúdo a ser desenvolvida nas aulas de Arte.
Referências
BRASIL. Lei n. 9394/96 – 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO. Parâmetros Curriculares Nacionais: Arte,
1998.
PIMENTEL, Lúcia Gouveia, CUNHA, Evandro José Lemos da, MOURA, José Adolfo.
Proposta Curricular CBC Arte Ensino Fundamental e Médio
Estado de Educação de Minas Gerais, 2006.
PIMENTEL, Lúcia Gouveia. Limites em Expansão: Belo Horizonte: C/Arte, 1999.
Autoras:
BARROS, Niara Barbosa. - Formada em Pedagogia pela Fundação Educacional Nordeste
Mineiro em Teófilo Otoni/MG, Pós-graduada em Adolescência e Relações de Gênero com
ênfase em Educação Afetivo-Sexual pela Newton Paiva, Pós-graduanda em Especialização
em Ensino de Artes Visuais pela EBA/ UFMG.
ANJOS, Cláudia Regina - Graduada em Licenciatura em Desenho e Plástica pela Fundação
Mineira de Arte Aleijadinho (1992), especialista em Arte/Educação, pelo CEPEMG. Mestra
em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2008). Professora
pesquisadora da Universidade Aberta do Brasil pela Escola de Belas Artes da Universidade
Federal de Minas Gerais e professora da EJA da Rede Municipal de Ensino de Belo
Horizonte. Atualmente é presidente da Associação Mineira de Arte/Educadores (2009/2012).. Belo Horizonte: Secretaria de
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